26 de junho de 2016

A UNIÃO EUROPEIA ABANDONADA PELA INGLATERRA

Britânicos comemoram a saída da Inglaterra da União Europeia

Paulo Roberto Campos

O tema em epígrafe, tão noticiado no dia de hoje — e tão chorado copiosamente pelas esquerdas do mundo inteiro —, ganha maior dimensão se considerado na perspectiva da análise feita por Plinio Corrêa de Oliveira no artigo A Federação Europeia à luz da doutrina católica, publicado na revista Catolicismo em fevereiro de 1952. Alguns trechos são transcritos abaixo entre aspas. 

Planejava-se, já naqueles idos, a formação de uma Federação Europeia, destinada a ser uma espécie de Estados Unidos da Europa ou algo nos moldes da atual União Europeia (UE). “Um acontecimento imenso” — comentava então o Prof. Plinio —, pois “são nações que desaparecem depois de terem enchido o mundo e a História com a irradiação de sua glória”.


A retirada da Inglaterra da UE mediante o recente plebiscito popular — que contou com 51,9% contra a permanência na UE e 48,1% a favor — pode ter sido o meio escolhido pelo país para ver-se livre das tirânicas imposições da UE, evitando assim perder suas características, suas tão belas tradições e a enorme riqueza que suas artes e seus valores peculiares encerram.

No mencionado artigo, o autor prognosticava que a constituição de um só bloco de nações europeias poderia padecer subjugado por ferrenhas mãos de burocratas que ditariam como cada país deveria ou não proceder. Vejamos.

“Uma Federação que procura passar a esponja sobre tantos séculos de História, evidentemente não pode ser construída só por um grupo de políticos e homens de gabinete, mediante a assinatura de um tratado. […] 

“Assim, pois, resumindo nossa impressão, tudo indica que, exceto uma guerra, nenhum fato natural deterá a constituição da Federação. Tanto mais quanto seus dirigentes já declararam oficialmente que saberão andar passo a passo, montando aos poucos as peças do novo organismo, e começando judiciosamente pelos alicerces”. 

Plinio Corrêa de Oliveira, no mesmo texto, trata do perigo que representaria uma Federação Europeia como um plano marxista para a implantação de uma República Universal, cujo governo visaria eliminar as desigualdades justas e harmônicas dos povos, assim como a beleza que há nas sadias características e costumes próprios da alma e da cultura de cada região. Para se constituir tal República Universal, seus dirigentes teriam também o objetivo de fundir as nações num amálgama amorfo e igualitário e suprimir os governos próprios de cada país, bem como suas fronteiras. Por isso, certamente, a maioria dos britânicos, receando perder algo de sua soberania, já deu “tchau” para a UE. 

“Antes de tudo devemos fazer sentir que a Igreja é contrária ao desaparecimento de tantas nações para constituir um só todo. Cada nação pode e deve manter-se, dentro de uma estrutura supranacional, viva e definida, com seus limites, seu território, seu governo, sua língua, seus costumes, sua lei, sua índole própria. […] 


“A Alemanha é uma nação, a França outra, a Itália outra. Se alguém as quisesse fundir como quem joga num cadinho joias de finíssimo valor, para as transformar num maciço lingote de ouro, inexpressivo, anguloso, vulgar, certamente não agiria segundo as vistas de Deus, que criou uma ordem natural na qual a nação é uma realidade indestrutível.

“Assim, pois, se a Federação Europeia tomar este caminho, será mais um mal, do que um bem. Deve ela ser a protetora das independências nacionais e não a hidra devoradora das nações. 

“As autoridades federais devem existir para suprir a ação dos governos nacionais em certos assuntos de interesse supranacional; nunca para os eliminar. Sua atuação nunca poderá ter em vista a supressão das características nacionais de alma e cultura, mas antes, na medida do possível, seu robustecimento. Precisamente como no Sacro Império Romano Alemão, em que cada nação podia desenvolver-se, dentro da órbita dos interesses legítimos e comuns da Cristandade, segundo a sua índole peculiar, sua capacidade, suas condições ambientes etc. 

“De outro lado, a estruturação econômica não deve chegar a um planejamento tal, que implique numa super-socialisação. Se o socialismo é um mal, sua transposição para o plano superestatal não poderá deixar de ser um mal ainda maior.


“No Sacro Império — todo penetrado de feudalismo, de regionalismo sadio, de autonomismo municipal, do autonomismo grupal das corporações, Universidades etc. — tal perigo só começou a se infiltrar quando apareceu, com os legistas, a semente do socialismo hodierno. Mas os legistas foram sempre uma excrescência na Cristandade, e sua influência coincidiu precisamente com o declínio do verdadeiro ideal cristão do Estado. 

“Por fim, permita-se-nos uma afirmação bem franca. Nenhuma sociedade, seja ela doméstica, profissional, recreativa, seja ela Estado, Federação de Estados, ou Império mundial pode produzir frutos estáveis e duráveis se ignorar oficialmente o Homem Deus, a Redenção, o Evangelho, a Lei de Deus, a Santa Igreja, e o Papado. Ocasionalmente, podem alguns de seus frutos ser bons. Mas se forem bons não serão duráveis e, se forem maus, quanto mais duráveis tanto mais nocivos.

“Se a Federação Europeia se colocasse à sombra da Igreja, fosse inspirada, animada, vivificada por Ela, o que não se poderia esperar? Mas, ignorando a Igreja como Corpo Místico de Cristo, o que esperar dela? 

“Sim, o que esperar dela? Alguns frutos bons, que convém notar e proteger de todos os modos, sem dúvida. Mas como é fundado esperar também outros frutos! E se estes frutos forem amargos, quanto se pode temer que nos aproximemos assim da República Universal, cuja realização a maçonaria há tantos séculos prepara?”.








17 de junho de 2016

A “Igreja pobre” do Vaticano II ao Papa Francisco


Roberto de Mattei

Segundo a opinião dominante dos teólogos, os documentos do Papa Francisco constituem meras indicações genéricas, de caráter pastoral e moral, destituídas de qualidade magisterial significativa. Esta é uma das razões pelas quais esses documentos são discutidos mais livremente do que acontecia antigamente com os textos pontifícios.

Entre as análises mais penetrantes dos textos do atual Pontífice, assinala-se o estudo de um filósofo da Universidade de Perugia, Flavio Cuniberto [foto acima], intitulado Senhora Pobreza. O Papa Francisco e a refundação do cristianismo (Blacks Pozza, Vicenza 2016), dedicado particularmente às encíclicas Evangelii Gaudium (2013) e Laudato sì (2015). O exame ao qual o Prof. Cuniberto submete os textos é o do estudioso que procura compreender suas teses de fundo, muitas vezes escondidas numa linguagem deliberadamente ambígua e elíptica. Sobre o tema da pobreza, Cuniberto traz à luz duas contradições: a primeira de natureza teológico-doutrinária, e a segunda de caráter prático. 

Em relação ao primeiro ponto, teológico-doutrinário, ele observa que o Papa Francisco, em contraste com o que pode ser deduzido a partir do Evangelho, faz da pobreza uma condição mais material do que espiritual, para transformá-la assim em uma categoria sociológica. Esta exegese transparece, por exemplo, na escolha em citar, para o sermão das bem-aventuranças, o evangelho de Lucas (6, 20), e não o relato mais preciso de São Mateus (5, 3), que usa o termo “pauperes spiritu”, ou seja, aqueles que vivem humildemente diante de Deus. 

Mas, para o Pontífice, a pobreza parece ser ao mesmo tempo um mal e um bem. Com efeito, observa Cuniberto, “se a pobreza como miséria material, exclusão, abandono, é indicada desde o início como um mal a ser combatido, para não dizer o mal dos males, e é, portanto, o objetivo principal da atividade missionária”, o novo significado cristológico que lhe atribui Francisco “faz dela simultaneamente um valor e, de fato, o valor supremo e exemplar”. Trata-se, sublinha o filósofo de Perugia, de um emaranhado complicado. “Por que combater a pobreza e erradicá-la quando ela é, pelo contrário, um ‘tesouro precioso’, e mesmo o caminho para o Reino? Inimigo a combater ou tesouro?” (pp. 25-26). 
*      *      * 
O segundo ponto, de caráter prático, refere-se às “causas estruturais” da pobreza. Supondo que esta seja um mal radical, o Papa Bergoglio parece individuar sua causa essencial na “desigualdade”. A solução indicada para erradicar esse mal seria aquela marxista e terceiro-mundista da redistribuição da riqueza: tirar dos ricos e dar aos pobres. Uma redistribuição igualitária que passaria por uma maior globalização dos recursos, não mais restrita às minorias ocidentais, mas estendida a todo o mundo. Mas na base da globalização está a lógica do lucro, que é criticada de um lado e propiciada de outro como uma forma de vencer a pobreza. O supercapitalismo, de fato, para se alimentar, necessita de um público de consumidores cada vez mais extenso, mas essa extensão do bem-estar em grande escala acaba alimentando as desigualdades que se desejaria eliminar. 

O livro do Prof. Cuniberto merece ser lido juntamente com o de um estudioso napolitano, o sacerdote Beniamino Di Martino, intitulado Pobreza e riqueza. Exegese dos textos evangélicos (Editrice Dominicana Italiana, Nápoles 2013). O livro é muito técnico e o Pe. Di Martino desmonta, através de uma análise rigorosa dos textos, as teses fundamentais de certa teologia pauperista. A fórmula “contra a cupidez, não contra a riqueza”, resume, segundo o autor, o verdadeiro ensinamento dos Evangelhos. 

Mas, pergunto eu, de onde provém essa confusão teológica, exegética e moral, entre pobreza espiritual e pobreza material? Não se pode ignorar o chamado “Pacto das Catacumbas”, assinado em 16 de novembro de 1965, nas Catacumbas de Domitila em Roma, por quarenta e cinco Padres conciliares que estavam tentando viver e lutar por uma Igreja pobre e igualitária. 

O grupo tinha entre seus fundadores o padre Paul Gauthier (1914-2002), que havia participado da experiência dos “Padres operários” do cardeal Suhard, condenada pela Santa Sé em 1953. Depois, com o apoio do bispo Dom Georges Hakim, do qual foi teólogo no Concílio, ele fundou na Palestina a família religiosa de Os companheiros e as companheiras de Jesus carpinteiro. Gauthier era auxiliado em Roma por sua companheira de luta Marie-Thérèse Lacaze, que se tornou sua mulher quando ele deixou o sacerdócio. 

Entre os que apoiaram o movimento estavam Dom Charles M. Himmer, bispo de Tournai (Bélgica), que acolhia suas reuniões no Colégio Belga de Roma; Dom Helder Câmara, que ainda era bispo-auxiliar do Rio e depois se tornou arcebispo de Recife; e o cardeal Pierre M. Gerlier, arcebispo de Lyon, em estreito contato com o cardeal Giacomo Lercaro, arcebispo de Bolonha, que se fazia representar pelo seu conselheiro Pe. Giuseppe Dossetti e pelo seu bispo auxiliar Dom Luigi Bettazzi (cfr. O Pacto das Catacumbas. A missão dos pobres na Igreja, por Xabier Pizaka e José Antunes da Silva, Edições Missionárias Italianas 2015).

Dom Bettazzi, o único bispo italiano participante do Vaticano II ainda vivo, também foi o único italiano a aderir ao “Pacto das Catacumbas”. Atualmente com 93 anos, ele participou de três sessões do Concílio Vaticano II e foi bispo de Ivrea de 1966 a 1999, quando renunciou por motivos de idade.

Se Dom Helder Câmara foi o “arcebispo vermelho” brasileiro, Dom Bettazzi entrou para a história como o “bispo vermelho” italiano. Em julho de 1976, quando parecia que o comunismo poderia tomar o poder na Itália, Dom Bettazzi escreveu uma carta ao então secretário do Partido Comunista Italiano, Enrico Berlinguer, ao qual reconhecia a intenção de realizar “uma experiência original de comunismo, diferente dos comunismos de outras nações”, e lhe pedia para “não hostilizar a Igreja”, mas, ao contrário, “estimular nela uma evolução segundo as exigências dos tempos e as expectativas dos homens, sobretudo dos mais pobres, que porventura o senhor poderá ou saberá mais apropriadamente interpretar”. O líder do PCI respondeu ao bispo de Ivrea através da carta Comunistas e católicos: clareza de princípios e bases de entendimento, publicada em “Renascita” de 14 de outubro de 1977. 

Nessa carta, Berlinguer negou que o PCI professasse explicitamente a ideologia marxista como filosofia materialista ateia, e confirmou a possibilidade de um encontro entre cristãos e comunistas no plano da “des-ideologização”. Não se trata de pensarem do mesmo jeito, mas de juntos fazerem o mesmo caminho — afirmava Berlinguer em substância —, na convicção de que não se é marxista no pensamento, mas se torna na prática. 

O primado marxista da praxis penetrou na Igreja de hoje sob a forma de absorção da doutrina pela pastoral. E a Igreja corre o risco de tornar-se marxista na prática também falseando o conceito teológico de pobreza. 

A pobreza autêntica é o desprendimento dos bens da Terra, de modo que eles sirvam para a salvação da alma, e não para a sua perdição. Todos os cristãos devem ser desapegados dos bens, porque o Reino do Céu é reservado aos “pobres de espírito”, e alguns deles são até chamados a viver uma pobreza efetiva, renunciando à posse e ao uso dos bens materiais. Mas esta escolha tem valor pelo fato de ser livre, e não imposta por outrem, como nos regimes coletivistas. 

Desde os primeiros séculos, as seitas heréticas pretenderam, pelo contrário, impor a comunhão dos bens, a fim de consumar nesta Terra uma utopia igualitária. Na mesma linha coloca-se hoje quem quiser substituir a categoria religiosa dos pobres em espírito pela categoria sociológica dos materialmente pobres.

Dom Luigi Bettazzi, autor do livro A Igreja dos pobres do Concílio ao Papa Francisco (Pazzini 2014) recebeu, em 4 de abril de 2016, a cidadania honorária de Bolonha e poderia receber a púrpura do Papa Francisco, sob cujo pontificado, de acordo com o mesmo ex-bispo de Ivrea, desenvolveu-se o Pacto das Catacumbas “como uma semente de trigo colocada sob a terra e crescida lentamente para dar seus frutos”.

_______ 

(*) Fonte: “Corrispondenza Romana”, 15-6-2016. Matéria traduzida do original italiano por Hélio Dias Viana.

12 de junho de 2016

HARMONIA ENTRE JUSTIÇA E MISERICÓRDIA

Capa da Revista Catolicismo junho/2016 [Foto LGA]

A misericórdia de Deus é infinita, como o é também sua justiça. Estes dois atributos divinos não se excluem, mas se integram maravilhosamente numa perfeita aliança. Nesse sentido, o Sagrado Coração de Jesus é invocado na ladainha: “Coração de Jesus, receptáculo de justiça e de amor”.



*      Paulo Roberto Campos

A principal celebração da Santa Igreja em junho é a festividade do Sagrado Coração de Jesus, comemorado este ano no dia 3, na sexta-feira seguinte à Oitava de Corpus Christi. Por feliz coincidência, corresponde neste ano à primeira sexta-feira de junho. Mas todo o mês é dedicado de modo especial ao Sacratíssimo Coração, que transpassado pela lança de Longino jorrou sangue e água — símbolos do sangue eucarístico e da água batismal que regeneram as almas. O Apóstolo São João presenciou essa pavorosa crueldade no alto do Calvário e dela prestou testemunho (Cfr. Jo 19, 33-37).

Longino atravessa o lado de Nosso Senhor
Jesus Cristo - Fra Angélico séc. XV. Museu de
São Marcos, Florença (Itália).
 

Com a dedicação do mês junho ao Sagrado Coração de Jesus, a Igreja visa honrá-lo e incentivar essa primordial devoção, a cujo respeito escreveu o Cardeal Pie: “O culto ao Sagrado Coração é a quintessência do cristianismo, o compêndio e sumário de toda a Religião”. Mas visa também promover atos de reparação pelos pecados dos homens, especialmente pelas ignomínias praticadas pelos ímpios, como aqueles que ultrajam a Sagrada Eucaristia. (vide quadro 1 no final) 


Essencial devoção para os atuais e calamitosos dias

Uma das grandes revelações do infinito amor de Deus para com a humanidade foi feita a Santa Margarida Maria Alacoque (1647-1690), religiosa do convento da Visitação de Santa Maria, em Paray-le-Monial (vide Catolicismo junho/2003). Uma das mais célebres afirmações de Nosso Senhor Jesus Cristo a essa freira visitandina, “confidente do Sagrado Coração de Jesus”, está expressa nestas sublimes palavras pronunciadas em 16 de junho de 1675:

Igreja da Santíssima Trindade, em Paris,
Capela do Sagrado Coração de Jesus.
Santa Margarida Maria Alacoque aponta
em direção ao Sagrado Coração de Jesus.
“Eis aqui o Coração que tanto amou os homens, que não poupou nada até esgotar-se e consumir-se, para testemunhar-lhes seu amor; e, por reconhecimento, não recebe da maior parte deles senão ingratidões, por suas irreverências, sacrilégios e pelas indiferenças e desprezos que têm por Mim no Sacramento do amor. Mas o que Me é ainda mais penoso é que corações que Me são consagrados agem assim.”(1)

Especialmente para a nossa época caótica, que se debate em meio à gravíssima crise religiosa, moral e social, a devoção ao misericordiosíssimo Coração se faz mais necessária do que nunca, pois Deus não abandona a humanidade pecadora mesmo nas piores crises, chamando-a constantemente à conversão. Ele oferece todos os meios para que o pecador se arrependa, repare suas culpas e se salve eternamente.

Mas se formos ingratos e indiferentes, desprezando os preceitos divinos e as graças concedidas misericordiosamente para nossa conversão, sentiremos o poder de sua justiça, que, assim como a misericórdia, é também divina. Como reza a ladainha do Sagrado Coração de Jesus: “Coração de Jesus, receptáculo de justiça e de amor, tende piedade de nós”. Ou, como numa outra ladainha, na qual ao mesmo tempo em que se invoca o “Coração de Jesus, cuja doçura se instila perenemente na alma fiel”, Ele também é invocado como “Coração de Jesus, inimigo de toda e qualquer culpa”, ou ainda como “Jesus, em cujo coração permanece escondido o dia da vingança contra os corações obstinados dos pecadores”.(2)
Imagem do Sagrado Coração de Jesus venerado na Basílica da Estrela (Lisboa), consagrada em 1789. A primeira igreja no mundo dedicada ao Sagrado Coração e construída por ordem de Dona Maria I — Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves — quando desse à luz um herdeiro do trono [Foto PRC]

Perigo da visão equivocada sobre a misericórdia divina

Esta revista já publicou algumas matérias (vide edições de junho/1986, julho/1988, junho/1992, junho/1994 e junho/2003) sobre a extraordinária devoção ao Sagrado Coração de Jesus. Na presente edição abordaremos um aspecto diferente: o verdadeiro conceito de misericórdia divina.

Nos dias atuais, fala-se exaustivamente de misericórdia. Sobretudo neste ano, declarado “Ano Santo da Misericórdia” (ou “Jubileu Extraordinário da Misericórdia”) pelo Papa Francisco através da bula Misericordiae Vultus (O Rosto da Misericórdia).

Mais recentemente, com a divulgação da “Exortação Apostólica Pós-Sinodal Amoris lætitia” (A alegria do amor), o tema da misericórdia foi ainda mais focalizado. Em suas 272 páginas, o documento pontifício — publicado no dia 8 de abril a propósito do último Sínodo da Família — emprega 46 vezes a palavra misericórdia!      

Entretanto, não se pode ter uma visão equivocada, considerando Deus de modo unilateral, pois Ele é infinitamente misericordioso, mas também infinitamente justo.

Em nosso Divino Criador, evidentemente, não há contradição. Ele deseja a salvação de todos e, para isso, nos oferece misericordiosamente o Céu por toda a eternidade. Porém, condena o pecador impenitente; aquele que, recusando toda a bondade divina, se aferra ao pecado mortal. Este, se não se arrepender, permanecendo obstinado no pecado grave, será atingido pela divina justiça.

Na absolvição dos pecados concedida pelo
sacerdote vemos o que realmente é
misericórdia
Pecou gravemente e não deseja ser condenado? — Não se desespere, pois há remédio. Com o coração contrito e humilhado e sinceramente arrependido, faça uma boa confissão com o firme propósito de não mais pecar. Nesse perdão — a absolvição dos pecados concedida pelo sacerdote — vemos o que realmente é misericórdia. Patenteia-se a beleza da clemência de Deus para com seus filhos e o extremo desejo que Ele tem em salvá-los.

Por isso, não há razão para desespero, porque mesmo temendo a justa punição por nossos pecados, devemos confiar e esperar a misericórdia do Divino Redentor, reservada especialmente àqueles que O temem. Et misericordia eius a progenie in progenies timentibus eum” (A sua misericórdia se entende de geração em geração sobre aqueles que o temem), como está expresso na oração da Santíssima Virgem o Magnificat registrada por São Lucas (Cfr. Lc 1, 39-56). Aliás, Ela é o sublime canal que nos leva ao mar de misericórdia que é o Sagrado Coração de Jesus.

É nesse equilíbrio entre a confiança na misericórdia e o temor do castigo que a alma progride na virtude. São as duas “asas” de que a alma necessita para progredir, análogas às de um pássaro que precisa das suas para voar. Apenas confiar na misericórdia sem o temor de Deus seria abuso da divina misericórdia. Nesse sentido, prescreve o Livro do Eclesiástico “Não digas: A misericórdia do Senhor é grande, ele terá piedade da multidão dos meus pecados, pois piedade e cólera são nele igualmente rápidas, e o seu furor visa aos pecadores” (Ecl. 5, 6-7).

No Evangelho, o caso da “mulher adúltera”

Nosso Senhor Jesus Cristo não disse
a ela: 
“Mulher, pode ir embora”.
Mas ordenou-lhe: 

“Vai e não peques mais” (Jo 8,11).
Conforme a narrativa do Evangelho, no caso da mulher que os escribas e fariseus queriam apedrejar por prática de adultério, Nosso Senhor Jesus Cristo não disse a ela: “Mulher, pode ir embora”. Mas ordenou-lhe: “Vai e não peques mais (Jo 8,11). Infelizmente, muitos comentam de modo estrábico essa passagem, dizendo apenas que Jesus não condenou a adúltera; omitindo que Ele a perdoou, mas lhe disse para não mais pecar.

Somente alguém psicologicamente e moralmente estrábico afirmaria que misericórdia é sinônimo de tolerância para com o pecado ou qualquer forma de mal. Deus manifesta suprema misericórdia para com o pecador verdadeiramente arrependido — e, nessa situação, a ninguém falta a graça divina —, mas também manifesta sua justiça para com o pecador empedernido, que abusa de modo contumaz de sua misericórdia.

Justo castigo por abusar da misericórdia divina

Santo Afonso Maria de Ligório (1696-1787), Doutor da Igreja, Padroeiro dos Confessores e dos Moralistas, define perfeitamente essa questão ao afirmar: “Deus envia mais gente ao inferno por abusar de sua misericórdia, do que por obra de sua justiça.”

É o tema que esse santo desenvolve ao tratar em um de seus sermões do abuso que o pecador faz da misericórdia, cujo trecho transcrevemos no final deste artigo. Ele afirma que o próprio demônio nos engana inspirando-nos o falso conceito de misericórdia, para que levemos uma vida pecaminosa, sem nos arrepender de nossas culpas nem confessá-las a um bom sacerdote.

O renomado jornalista italiano Sandro Magister, especializado em temas religiosos, publicou recentemente um interessante artigo intitulado Giubileo della misericordia, ma con i confessionali vuoti (Jubileu da misericórdia, mas com os confessionários vazios), no qual reproduz a carta de um sacerdote, que lhe escreveu contando a seguinte observação: neste “Ano Santo da Misericórdia” os confessionários estão vazios — como se a misericórdia dispensasse o pecador do sacramento da penitência (ou confissão). Entretanto, no “Ano Santo da Misericórdia” deveria ocorrer justamente o contrário: aproveitar a ocasião para pedir especial misericórdia ao Sagrado Coração de Jesus, acorrendo multidões aos confessionários. É o que não acontece... Os confessionários estão às moscas...

Evitemos qualquer forma de unilateralismo

Em seu livro Em Defesa da Ação Católica, Plinio Corrêa de Oliveira desenvolve o tema da justiça e da misericórdia, do perdão e do castigo divinos, recomendando não sermos unilaterais, vendo apenas um aspecto de Deus. O autor cita D. Antonio Joaquim de Melo (1791-1861), “um dos maiores Bispos que teve o Brasil”, que — corroborando a afirmação acima citada de Santo Afonso de Ligório —, dizia: “a Misericórdia de Deus tem mandado mais almas para o inferno do que sua Justiça.”. E o Prof. Plinio comenta: “Em outros termos, afirmava o grande Prelado que a esperança temerária de salvação perderá maior número de almas, do que o temor excessivo da Justiça de Deus. Do mesmo modo, é indiscutível que a excessiva benignidade na aplicação das penas, que ora se observa em muitas associações religiosas, e a inteira carência delas em certos setores, têm depauperado mais as fileiras dos filhos da luz, do que os atos de energia inconsiderados e talvez excessivos, eventualmente levados a cabo”.(3) 

A misericórdia de Deus não contradiz a sua justiça

Se Deus em sua infinita misericórdia não punisse os pecados cometidos, Ele seria injusto. Assim, o verdadeiro amor a Deus consiste em amá-lo e glorificá-lo tanto por sua misericórdia quanto por sua justiça. Do contrário, seria como se não desejássemos a punição devida aos pecados, às ingratidões, aos crimes, às blasfêmias etc. Seria como um pai que elogiasse seu filho por algum ato bom praticado, mas não o repreendesse devido a algum mal cometido. Donde o proverbio “Andam juntas em Deus a justiça e a misericórdia”. (vide quadro 2 no final).

Nosso Senhor Jesus Cristo nos deu um supremo
exemplo: perdoou o ladrão que se mostrou
arrependido, mas não o ladrão obstinado
em seus pecados
Em seus últimos momentos antes da agonia na Cruz, Nosso Senhor Jesus Cristo nos deu um supremo exemplo: perdoou o ladrão que se mostrou arrependido, mas não o ladrão obstinado em seus pecados. “Misericórdia e ira estão sempre em Deus, grandemente misericordioso, porém capaz de cólera. Os seus castigos igualam sua misericórdia; ele julga o homem conforme as suas obras. O pecador não escapará em suas rapinas, e não será postergada a espera daquele que exerce a misericórdia” (Livro do Eclesiástico 16, 12-14). 

Confirmando essa passagem da Sagrada Escritura e a fim de se evitar uma concepção equivocada de misericórdia, em uma revelação feita a Santa Brígida da Suécia (1303-1373) [imagem ao ao lado] Nosso Senhor Jesus Cristo lamentou: “Todos creem e pregam que sou misericordioso, entretanto quase ninguém crê que eu seja um Juiz justo. Consideram-me um juiz que não tem equidade. De fato, um juiz seria iníquo se, ao lado da misericórdia, deixasse os ímpios sem castigo de forma que pudessem continuar oprimindo os justos. Contudo, Eu sou um Juiz justo e misericordioso e não deixarei que o menor pecado fique sem castigo, nem que o menor bem fique sem recompensa. Infiltrados na Santa Igreja, pessoas que pecam sem medo negam que eu sou justo.”(4) 

Misericórdia para quem teme a Deus e não para quem abusa dela

Como referido acima, segue a transcrição de um trecho do sermão de Santo Afonso Maria de Ligório [imagem abaixo], considerado um dos maiores moralistas de todos os tempos. Com este trecho — que parafraseando Joseph de Maistre poder-se-ia intitular “la colère de l´amour” (a cólera do amor) —, encerramos estas considerações pedindo à Virgem Maria, Mater Misericordiae, que nos alcance as misericórdias do Sagrado Coração de Jesus, compreendendo bem a perfeita união entre a misericórdia e a justiça divinas.


“Quando uma alma abusa da misericórdia divina, a misericórdia divina está bem próxima de a abandonar”

         
“Pode ser que haja, no meio de vós, meus irmãos, alguém que se encontre com a alma carregada de pecados e que — longe de pensar em se livrar deles pela confissão e penitência — não cessa de cometer novos pecados, se sobrecarregando ainda mais. Este, certamente, abusa da misericórdia divina; pois, a que fim nosso Deus tão bom deixa que este pecador viva senão para que ele se converta e, por consequência, escape da desgraça de perder sua alma?

     Ele merece as severas censuras que o Apóstolo dirigiu ao povo judeu impenitente: Porventura desprezas as riquezas da bondade, da paciência e da longanimidade de Deus? Ignoras que sua bondade te convida à penitência? Mas que na tua dureza e coração impenitente, acumulas para ti um tesouro de ira no dia da ira e da manifestação do justo juízo de Deus (Rom. II. 4,5).

      Eu quero vos afastar, meus irmãos, desse funesto abuso, e vos preservar da desgraça de cair na morte eterna do inferno. A esse propósito, chamo vossa atenção para a seguinte verdade: Quando uma alma abusa da misericórdia divina, a misericórdia divina está bem próxima de a abandonar […].

Santo Agostinho observa que, para enganar os homens, o demônio emprega ora o desespero, ora a confiança.
Após o pecado, o demônio nos mostra o rigor da justiça de Deus para que desconfiemos de Sua misericórdia. Entretanto, antes do pecado, o demônio nos coloca diante dos olhos a grande misericórdia de Deus, a fim de que o receio dos castigos, devidos ao pecado, não nos impeça de satisfazer nossas paixões […].

Essa misericórdia sobre a qual vós contais para poder pecar, dizei-me, quem vo-la prometeu? — Não Deus, certamente, mas o demônio, obstinado em vos perder. Cuidado!, diz São João Crisóstomo, de dar ouvidos a este monstro infernal que vos promete a misericórdia celeste […].

Deus é cheio de misericórdia, eu pecarei e em seguida confessar-me-ei’. Eis aí a ilusão, ou antes, a armadilha que o demônio usa para arrastar tantas almas ao inferno![…].

          Nosso Senhor, aparecendo um dia a Santa Brígida, queixou-se: ‘Eu sou justo e misericordioso, mas os pecadores não querem ver senão minha misericórdia’ (Ego sum justos et misericors; peccatores tantum misericordem me existimant – Rev. 1. I. c. 5). Não duvideis, diz São Basílio, que Deus é misericordioso, mas saibamos que Ele é também justo, e estejamos bem atentos para não considerar apenas uma metade de Deus. Uma vez que Deus é justo, é impossível que os ingratos escapem do castigo […]. Misericórdia! Misericórdia! Sim, mas para aquele que teme a Deus, e não para aquele que abusa da paciência divina!”.(5)
Nosso Senhor expulsa os vendilhões do Templo,
num arrebatamento de indignação e amor pelos direitos
de Seu Pai

__________

Notas: 

1.       Sainte Marguerite Marie, Sa vie écrite par elle-même, Edições Saint Paul, Paris, 1947, pp. 70-71. Imprimatur de M. P. Georgius Petit, Bispo de Verdun.
2.       Diarium Perpetuum Clericorum et Religiosorum, Typographia Pontificia in Instituto Pii IX, Roma, 1911.
3.       Plinio Corrêa de Oliveira, Em Defesa da Ação Católica, Artpress, 2ª edição, 1983, pág. 153.
4.       As Profecias e Revelações de Santa Brígida da Suécia, Livro 1, Capítulo 5.
5.       Sermons de S. Alphonse de Liguori, Analyses, commentaires, exposé du système de sa prédication, por R.P. Basile Braeckman, da Congregação do T. S. Redentor, Tomo Segundo. Jules de Meester-Imprimeur-Éditeur, Roulers, pp. 55-60).


_________________ Quadro 1 _________________

“Festa especial para honrar meu Coração”


“Que se comungue nesse dia e se faça reparação através de um pedido de perdão, a fim de reparar as afrontas que Ele recebeu durante o tempo em que esteve exposto nos altares”.

Estando diante do Santíssimo Sacramento um dia, dentro da oitava de Corpus Christi (em junho de 1675) –– narra Santa Margarida Maria Alacoque, religiosa visitandina e grande vidente, escolhida por Nosso Senhor para comunicar ao mundo a devoção a seu Sagrado Coração ––, recebi de meu Deus enormes graças de seu amor. E sentindo-me tocada pelo desejo de Lhe retribuir algo, de Lhe pagar amor com amor, disse-me Ele: “Tu não Me podes conceder maior retribuição do que fazendo o que já tantas vezes te pedi”. Então, mostrando-me seu divino Coração: “Eis o Coração que tanto amou os homens, que nada poupou, até esgotar-se e se consumir para lhes testemunhar seu amor; e como recompensa não recebo da maior parte deles senão ingratidões, por suas irreverências e seus sacrilégios, e por friezas e desprezos que têm para comigo neste Sacramento de Amor. Mas o que Me é ainda mais sensível é que são os corações que Me são consagrados que se comportam assim. É por isto que te peço que a primeira sexta-feira depois da oitava de Corpus Christi seja dedicada a uma festa especial para honrar meu Coração, que se comungue nesse dia e se faça reparação através de um pedido de perdão, a fim de reparar as afrontas que Ele recebeu durante o tempo em que esteve exposto nos altares. Eu te prometo também que meu Coração se dilatará para derramar com abundância os efeitos de seu divino amor sobre aqueles que Lhe dispensarem esta honra e se empenharem para que ela Lhe seja prestada”.

Confidente do Salvador e depositária de suas expressas intenções sobre o dia e a finalidade a que o Céu queria ver destinada a nova festa, Santa Margarida Maria ficou realmente encarregada de promulgá-la e dirigir sua celebração no mundo inteiro.

Para conseguir o resultado que ultrapassava as forças pessoais da humilde religiosa, o Senhor havia aproximado misteriosamente de Santa Margarida Maria um dos mais santos religiosos que possuía então a Companhia de Jesus, o Revmo. Pe. Cláudio de la Colombière. Ele reconheceu a santidade das vias pelas quais o Divino Espírito conduzia a santa e se fez o apóstolo devotado do Sagrado Coração, em Paray-Ie-Monial primeiramente e até na Inglaterra, onde ele mereceu o glorioso título de confessor da fé, nos rigores das prisões protestantes. Esse fervoroso discípulo do Coração do Homem-Deus morreu em 1682, esgotado por trabalhos e sofrimentos. Mas, na ocasião, a Companhia de Jesus inteira herdou seu zelo em propagar a devoção ao Sagrado Coração.

A aprovação formal da Sede Apostólica a essa devoção não deveria tardar muito em relação ao empenho já manifestado pela piedade católica quanto ao divino Coração. Roma havia já concedido numerosas indulgências às práticas privadas e erigido mediante breves pontifícios inúmeras confrarias quando, em 1765, Clemente XIII, cedendo às instâncias dos Bispos da Polônia e da Arquiconfraria Romana do Sagrado Coração, emitiu o primeiro decreto pontifical em favor da festa do Coração de Jesus, aprovando para comemorá-la uma Missa e um Ofício. Concessões locais estenderam pouco a pouco este primeiro favor a outras circunscrições eclesiásticas, até que enfim, no dia 23 de agosto de 1856, Pio IX, de gloriosa memória, solicitado por todo o Episcopado francês, emitiu o decreto que inseria no calendário litúrgico a festa do Sagrado Coração e ordenava a sua celebração à Igreja universal. Trinta e três anos mais tarde, Leão XIII elevava a rito de primeira classe a solenidade que seu predecessor havia estabelecido.
_____________
(D. Prosper Guéranger, L’Année Liturgique – Le temps après la Pentecôte, Maison Alfred Mame et Fils, Tours, 1922, quinzième éd., Tome 1, excertos das pp. 540–545).


_________________ Quadro 2 _________________

Impossibilidade de ser misericordioso sem ser justo 

“Sem dúvida Deus é misericordioso, mas é também justo. Queriam os pecadores que Deus fosse misericordioso sem ser justo; mas isso é impossível. Ora, se Deus perdoasse sempre e nunca castigasse, faltaria à justiça. Vem a propósito a observação do Padre-Mestre de Ávila: ‘Se Deus, diz ele, sofresse que se abusasse da sua misericórdia, para mais livremente O ultrajar, tal paciência não seria bondade, mas sim falta de justiça’. Deus tem de castigar os ingratos: suporta-os até certo ponto, depois castiga-os. [...]

“’Não vos enganeis: de Deus não se zomba’ (Gal. 6, 7). Seria, com efeito, escarnecer de Deus querer continuar a ofendê-lo sempre, e esperar contudo possuí-lo no Paraíso. ‘Colherá cada um o que tiver semeado’ (ibid. 8). Quem semeia boas obras, colherá recompensas; quem semeia pecados, colherá castigos. ‘É abominável a esperança deles’ (Job 11, 20), está escrito em Job; sim, a esperança dos que pecam porque Deus perdoa é abominável diante de Deus. É que esta mesma esperança atrai sobre a cabeça deles um castigo mais pronto, como a audácia de um escravo a quem a bondade do seu senhor levasse a faltar-lhe o respeito”.
_______________

(Santo Afonso de Ligório, O caminho da Salvação e da Perfeição, trad. De Mons. M. Marinho, Tipogr. Fonseca, Ltda., Editora, Porto, 1948, p. 26).