26 de dezembro de 2017

A multiforme inspiração do Espírito Santo nos panetones e bolos de Natal


Santiago Fernandez (*) 

Nos países católicos há uma imensa variedade de pratos e bolos que se preparam somente para o Natal. Nesse ponto os italianos acabaram passando na frente de todos os outros ao criarem o universalmente conhecido e cobiçado “panettone”. 

De onde ele vem? 


Discute-se fortemente na Itália sobre a sua origem. Todos concordam que nasceu na região de Milão. 

Segundo uma versão, o panettone apareceu pelo fim do século XV num banquete oferecido pelo tempestuoso duque Ludovico Sforza, dito “o Mouro”. O ajudante de cozinha, de nome Toni, encarregado de vigiar o forno durante a preparação da sobremesa, teria dormido. E quando acordou ela estava queimada! 

Para se salvar da ira do colérico duque, ele apanhou então tudo o que sobrara na cozinha e misturou, para produzir um pão “enriquecido” que fez as delícias de todos. Essa obra-prima passou para a posteridade como o “pão de Toni”, que acabou dando em “panettone”. 


Mas há outra versão: o jovem nobre Ughetto degli Atellani, que desejava casar-se com Algisa, filha do padeiro Toni, teria conseguido ser contratado pela padaria, onde concebeu o famoso pão de Natal para conquistar a moça. 

Outra versão ainda é aquela segundo a qual Sóror Ughetta — cujo nome significa passa — teria comprado com suas últimas moedas algumas passas e frutas cristalizadas para acrescentar a seu pão de Natal, levando assim um sorriso às irmãs de seu convento. 

O fato histórico incontestável é que, entre outras coisas, na Idade Média nasceu o costume de comemorar o Natal com um pão que fosse melhor do que o quotidiano. Até 1395 os fornos de Milão só podiam assar esse pão no período natalino, e ele era marcado com frequência com uma cruz. 
"Pandoro" de Verona
Mas há o “panettone” glacê e com amêndoas de Turim. E também o “pandoro”, de Verona, que é muito alto, pesa cerca de um quilo, tem sabor de baunilha, uma miga muito leve e é servido num pacote feito com açúcar cristalizado que também se come. 


"Panforte" de Siena
Em Veneza, o “panettone” vem acompanhado de um creme de frutas cristalizadas. Há ainda o “pandolce” de Gênova, um pouco mais compacto, bem como o “panforte” de Siena, feito com especiarias e sem farinha, com a massa consolidada com mel, pimenta e canela. 

O sul da Itália aplicou sua inspiração ao “panettone”, que vinha do Norte, acrescentando-lhe delícias que são inéditas nas regiões frias: laranja, limão, pistache, bergamota e o licor limoncello. 

O “panettone” de Nápoles é feito com laranjas cristalizadas de Amalfi e limoncello. Em Siracusa, ele vem com chocolate, pistaches, laranjas cristalizadas da Sicília e passas de Pantelleria. Todos eles em geral têm preços acessíveis. 


"Christmas pudding" inglês
Deixando agora a Itália e passando a outros países, os britânicos preparam o tradicional “pudding”, oriundo da Idade Média. Segundo instrução da Igreja Católica, ele “deve ser feito no domingo após a festa da Santíssima Trindade, que neste ano de 2017 foi celebrado em 18 de junho. É preparado com 13 ingredientes para representar Cristo e os 12 Apóstolos, e todos os membros da família devem dar uma mexida em sua massa durante a preparação, um de cada vez, de leste a oeste, a fim de homenagear os Reis Magos e sua suposta jornada nessa direção”. 

Por sua vez, os belgas degustam os chamados “cougnoles” ou “cougnous”, pães do tipo brioche cujo tamanho varia entre 15 e 80 cm, com a forma de um presépio que acolhe uma imagenzinha do Menino Jesus. 


"Christstollen" alemão
Os alemães preparam o “Christstollen”, bolo muito denso perfumado com especiarias e recheado com frutos cristalizados e passas, assado numa forma especial. 

Os espanhóis no Natal preferem o “turrón”, uma massa feita com amêndoas e mel. Ele tem muitas variantes: com chocolate, nozes, frutas secas etc. 

Os franceses comemoram com a “bûche”, literalmente pedaço de lenha, que suscita todo ano um verdadeiro concurso para ver quem é o “pâtissier” que concebe a variante mais criativa. 


"Büche de Noël"
Durante séculos, as famílias francesas acendiam na noite de Natal um pedaço de lenha de árvores frutíferas como cerejeira, ameixeira, macieira ou oliveira, ou de madeiras nobres ou comuns. Ficou conhecida como a “bûche de Noël”. 


A família aquecida por esse fogo se reunia para a Ceia de Natal entoando canções. Com o tempo entraram novos sistemas de aquecimento e as velhas lareiras foram se apagando. 

Mas eis que a “bûche de Noël” se transformou em uma obra-prima da pâtisserie francesa, a sobremesa indispensável nos lares da França nos dias abençoados do Natal. É difícil conhecer o autor do prodígio, embora talvez tenham sido muitos, guiados em diversas partes pelo instinto católico, pela tradição e pelo bom gosto. 

Fala-se que um aprendiz de Paris, que trabalhava numa chocolataria do aristocrático bairro de Saint Germain des Prés, teria sido o autor da ideia. Os palacetes do bairro eram habitados por nobres ligados a seus castelos, erigidos muitas vezes em bosques e em contínuo contato com a agricultura e as tradições locais. 


Como esses nobres não encontravam suas rústicas, mas abençoadas “bûches de Noël” na refinada Paris, então o aprendiz concebeu um doce em forma de lenha para lhes aplacar a saudade inspirada pela fé. 

Segundo outros, o famoso bolo foi inventado em Lyon por volta de 1860. Há os que defendem que Pierre Lacam, pasteleiro e sorveteiro do príncipe Carlos III de Mônaco, teria concebido a primeira requintada “bûche” em 1898. 

Quem quer que seja o seu inventor, nas proximidades do Natal a “bûche de Noël” aparece nas pâtisseries da França em forma de sorvete ou bolo, sendo avidamente procurada pelos espíritos amantes da família, da tradição e da Cristandade. 

Na Córsega ela é forçosamente feita à base de castanhas, embora as fórmulas e apresentações sejam inumeráveis, de acordo com a preferência das famílias, dos padeiros, dos confeiteiros de cada região, cidade, rua ou loja. 


"Galettes des rois" da França
Já no início de janeiro as vitrines das pâtisseries de Paris se enchem de “galettes des rois”, conta “Le Petit Journal”. O nome — como o de tantos produtos culinários franceses — não tem tradução, mas alguns tentaram “bolo dos reis”. Ele é vendido com uma coroa especial. Em 2014, entre 85% e 97% dos franceses diziam comê-lo na festa da Epifania, ou Reis. As receitas, acompanhamentos e formas são incontáveis, em geral redondas. Quando o “bolo dos reis” contém o apreciado marzipã, é chamado de “parisiense”; com frutas abrilhantadas é o bordalês. 


"Bolo rei" de Portugal
Em Portugal, ele é feito de um modo especial e recebe o nome de “Bolo Rei”, designação que sublevou sem sucesso muitos revolucionários igualitários e republicanos. Existem receitas semelhantes na cidade norte-americana de Nova Orleans, na Bélgica, no México (“rosca”), na Grécia (“vassilopita”) e na Bulgária (“pitka”), para só citar algumas.


Voltando à França, o mais típico é que a criança mais nova sentada à mesa se encarregue de cortar a “galette des rois” e distribua um pedaço para cada um. Em alguma parte do bolo há uma fava, também chamada “rei”, que faz a alegria da mesa. 

A fava respeita a forma de sua humilde semente original, mas depois passa a ser substituída por pequenos objetos simbólicos imaginosos, como lâmpadas douradas e outros. O fato é que quem recebe o pedaço com a “fava” é chamado de “rei”, ganha a coroa que veio com o bolo e deve beber em uma taça especial, enquanto os demais cantam “o rei bebe, o rei bebe”, em meio ao gáudio geral. 

Aliás, nos bons tempos partia-se a “galette” de acordo com o número dos presentes mais um. Esse pedaço excedente era chamado “a parte do Bom Deus”, ou “a parte da Virgem”, ou “a parte do pobre”, e era destinado ao primeiro pobre que fosse bater à porta do lar. 

O costume comemora a festa da Adoração do Menino Jesus pelos Reis Magos, ou Epifania, celebrada em 6 de janeiro. A Epifania comemora precisamente a chegada de Melchior, Gaspar e Balthazar, conduzidos pela milagrosa estrela. 

Na Espanha, os Reis Magos são muito mais importantes para as crianças do que Papai Noel. São eles que trazem os presentes na noite de 5 para 6 do janeiro, depositando-os sobre os sapatinhos infantis deixados na sacada ou na lareira. 


"Roscón de Reyes" da Espanha
É normal que o fato seja comemorado com um bolo. É o denominado “Roscón de Reyes” em forma de coroa, o qual introduz uma variedade grande em relação à “galette des rois” francesa. 

Foi só no mundo católico que a ação multiforme da graça do Espírito Santo inspirou uma tão larga variedade de pães simples, mas deliciosos, próprios a elevar os espíritos e a fortalecer o corpo nos gaudiosos dias do nascimento do Redentor. 

Procure-se entre os protestantes ou nos decaídos países pagãos e veja se eles criaram uma variedade análoga de uma iguaria saborosa e inocente, tão de acordo com o espírito sobrenatural do Natal católico.

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Fonte: Revista Catolicismo, Nº 804, Dezembro/2017.

23 de dezembro de 2017

A noite entre todas sagrada

Nas pompas festivas da Missa do Galo, as famílias, os povos, as nações se sentiam ungidos pelo júbilo sacral descido do mais alto dos céus 


Plinio Corrêa de Oliveira (*)

O Advento, período que no ano litúrgico compreende as quatro semanas antecedentes ao Natal, constituía para a Cristandade uma parte do ano especialmente voltada para o recolhimento, para uma discreta compunção e para a esperança palpitante do grande júbilo que o nascimento do Messias trará. Todos se preparavam assim para acolher o Menino-Deus que, no virginal sacrário materno, se acercava, dia a dia mais, do momento bendito em que iniciaria sua convivência salvífica com os homens.  

Nessa atmosfera densa e vividamente religiosa, a tônica se ia gradualmente deslocando. À medida que se aproximava a noite entre todas sagrada, a compunção ia cedendo lugar à alegria. Até o momento em que, nas pompas festivas da Missa do Galo, as famílias, os povos, as nações se sentiam ungidos pelo júbilo sacral descido do mais alto dos céus; e em cada cidade, em cada lar, no interior de cada alma se difundia, como um bálsamo de celeste odor, a impressão de que o Príncipe da Paz, o Deus Forte, o Leão de Judá, o Emanuel, mais uma vez acabava de nascer. Stille Nacht, Heilige Nacht... a canção célebre que se transpôs para nosso vernáculo, de modo menos expressivo, como Noite Feliz.  
De toda essa preparação, o que restou? Do Advento, quem hoje cogita senão uma minoria ínfima? E dentro dessa minoria ínfima, quantos o fazem sob a influência da verdadeira teologia católica e tradicional, e não das teologias ambíguas e desvairadas que sacodem hoje em dia o mundo cristão, como se fossem convulsões de febre?

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Excertos do artigo de Plinio Corrêa de Oliveira, “No crepúsculo do sol de justiça”, publicado na “Folha de S. Paulo” em 1º-1-1979.

18 de dezembro de 2017

“Minha mulher não trabalha”

Plinio Maria Solimeo 

Quanto trabalha uma dona de casa hoje em dia? É preciso considerar que as atuais leis trabalhistas transformaram a maioria das empregadas domésticas em reivindicadoras sindicalizadas que só pensam em seus direitos e muito pouco em seus deveres. Contratá-las atualmente é expor-se ao risco de muitos problemas trabalhistas. Já foi o tempo em que uma boa empregada doméstica acabava sendo quase que uma extensão da família, em que o trato entre patroa e empregada era pautado pelo entendimento, pela cordialidade e, em muitos casos, também pelo afeto mútuo. 

Mas, voltando ao caso, para muitos o trabalho de uma dona de casa é leve, cheio de remansos, dando-lhe tempo livre para leituras, repouso etc. Mas a coisa não é assim. 

Uma matéria colocada por um habitante da Flórida no seu perfil de Facebook em março de 2016 chamou tanto a atenção por sua realidade, que foi compartilhada mais de 400 mil vezes, gerando mais de 700 mil reações e cerca de 500 comentários. Ela imagina a conversa de um executivo com seu psicólogo, e diz assim: 

Conversa entre um executivo (H) com seu psicólogo (P).

P. – O que o senhor faz para ganhar a vida, Sr. Rogers?

H. – Trabalho como contador em um banco. 

P. – E sua esposa? 

H. – Não trabalha. Ela é dona de casa. 

P. – Quem prepara o café da manhã para sua família? 

H. – Minha mulher, porque ela não trabalha. 

P. – A que horas se levanta sua mulher?

H. – Ela se levanta cedo para organizar tudo. Prepara o lanche para as crianças, assegura-se de que estão todos bem vestidos e penteados, que tomem o café da manhã, que escovem os dentes, e que levem todas as coisas para a escola. Desperta o bebê, troca-lhe as fraldas e a roupa, e também o amamenta. 

P. – Como seus filhos vão à escola? 

H. – Minha mulher os leva, porque ela não trabalha. 

P. – Depois de levar seus filhos à escola, o que ela faz? 

H. – Normalmente, para não ter que tirar e pôr a cadeirinha do bebê no carro muitas vezes, pensa em algo que possa fazer para aproveitar que está fora, como pagar contas ou fazer compra. Às vezes, se se esquece de algo, tem que fazer a viagem outra vez com o bebê nas costas. Quando volta para casa, tem que alimentar o bebê de novo, trocar-lhe as fraldas, e prepará-lo para sua sesta. Ordena a cozinha, e logo se encarrega da limpeza da casa, pois ela não trabalha.

P. – À noite, depois de voltar do escritório, o que o senhor faz? 

H. – Descanso, é claro, pois estou cansado depois de trabalhar o dia todo no banco. 

P. – O que faz sua esposa à noite? 

H. – Prepara o jantar e o serve a mim e às crianças, lava os pratos, ordena mais uma vez a casa, assegura-se de que nosso cachorro está em casa, e guarda os restos do jantar. Depois de ajudar as crianças com os deveres de escola, veste-lhes o pijama, dá-lhes um copo de leite, assegura-se de que escovem os dentes, e muda as fraldas do bebê. Uma vez na cama, ela se desperta várias vezes para dar de mamar ao bebê, e mudar-lhe as fraldas se é necessário, enquanto descansamos. Porque ela não tem que levantar-se cedo para ir trabalhar...

Embora esse relato esteja escrito de um modo um tanto jocoso, essa é a pura realidade. E eu, sendo de família numerosa, posso afirmar que ainda está um pouco longe da realidade. Pois não fala de outras coisas, como ter de remendar, lavar e passar a roupa, encerar o assoalho, atender a um filho que está doente e precisa de cuidados etc. 

Acontece então uma coisa curiosa: uma dona de casa assim ocupada não tinha tempo para devaneios, para romantismos, para sonhos de olhos abertos. Por isso, aceitava a vida como ela era, e não se fazia ilusões. O que tinha como conseqüência que o convívio familiar era muito mais intenso e muito mais caloroso, e praticamente não havia divórcios.

Ainda hoje, não são em geral as donas de casa que se divorciam por “me dá cá aquela palha”, mas aquelas que têm emprego fora e vivem de um modo tal que a vida de família pesa muito pouco em suas decisões.

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Fonte: https://www.actuall.com/familia/la-factura-en-la-sombra-del-ama-de-casa-en-espana-supera-los-2-500-euros-mensuales/

16 de dezembro de 2017

1967 – 2017: meio século de uma graça extraordinária


Leo Daniele 

“Será que meus amigos não percebem que estou muito doente?” 

Foi o que pensou em 1967 o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira, sentindo-se debilitado e vendo sua figura, muito abatida, num filme documentário. 

De fato não percebiam, porque ele, sempre muito apostólico e desejoso de animar seus discípulos, disfarçava e não reclamava dos sofrimentos que a Providência lhe pedia. 


Dias depois revelou-se a enfermidade: uma terrível crise de diabete, com ameaça de gangrena, que o fez internar num hospital às pressas. O prognóstico mais provável era ter de submeter-se a algumas cirurgias, que seriam cada vez mais radicais e de eficácia duvidosa. Uma primeira intervenção, com amputação de alguns artelhos do pé, foi executada. 

No dia 16 de dezembro de 1967, há exatamente 50 anos, um de seus amigos, visitando-o, trouxe uma reprodução italiana, em grande formato [acima e ao lado, que se encontra no quarto de Plinio Corrêa de Oliveira], de Nossa Senhora do Bom Conselho de Genazzano.

O Prof. Plinio olhou para a estampa longamente. Depois seu estado de ânimo mudou, mostrando-se mais bem disposto. Algo de sublime se passou naquele momento, pelo qual ele se ligou estreitamente a Nossa Senhora de Genazzano até o fim de sua vida. A partir daí ele começa a recuperar-se, até retomar suas atividades habituais, sem necessidade de novas intervenções cirúrgicas.

10 de dezembro de 2017

Uma solução para Jerusalém: a internacionalização da Cidade Santa


Paulo Roberto Campos

A respeito do post de ontem, intitulado A QUEM PERTENCE JERUSALÉM?, recebi hoje de um colega — tarimbado, brilhante e arguto analista político — este e-mail: 
“Li seu substancioso artigo. Talvez valesse a pena um adendo. ‘Rebus sic stantibus’, creio seria ainda hoje a posição de Dr. Plinio Corrêa de Oliveira”. 
Em vista do recente reconhecimento, por parte dos Estados Unidos, de Jerusalém como capital oficial de Israel, vem muito a propósito o referido adendo, que é uma matéria da TFP publicada na revista Catolicismo (Nº 200 - Agosto de 1967). Ei-la: 


CHANCELER INFORMA À TFP: BRASIL APÓIA A INTERNACIONALIZAÇÃO DE JERUSALÉM



Com data de 11 de junho (de 1967), a Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade enviou telegrama ao Presidente Costa e Silva e ao Chanceler Magalhães Pinto, pedindo que o Brasil propusesse urgentemente, a todos os países latino-americanos, dar apoio conjunto à internacionalização de Jerusalém, segundo o desejo de Sua Santidade o Papa Paulo VI. É o seguinte o texto do despacho: 


"Peço a Vossa Excelência que o Brasil proponha urgentemente a todas as nações da América Latina darem apoio conjunto à internacionalização de Jerusalém, desejada pelo Santo Padre Paulo VI. 

Essa medida, já múltiplas vezes pedida em solenes Documentos do inolvidável Pio XII, constitui merecida homenagem à Cidade Sagrada, que ficará assim resguardada de futuros riscos.  
Corresponde às tradições cristãs brasileiras, bem como a nossos foros de mais populosa das nações católicas, assumir essa simpática iniciativa, a qual será entusiasticamente aplaudida por todos os brasileiros. 

Na antecipada certeza da favorável acolhida de Vossa Excelência, apresento cordiais e respeitosos cumprimentos.  
Plinio Corrêa de Oliveira 

Presidente do Conselho Nacional da 

Sociedade Brasileira de Defesa da Tradição, Família e Propriedade". 


Em resposta, o Ministro do Exterior telegrafou nestes termos, em data de 7 de julho (de 1967), ao Prof. Plinio Corrêa de Oliveira:
"O Senhor Presidente da República encaminhou-me o telegrama pelo qual Vossa Senhoria solicita o apoio do Brasil à internacionalização de Jerusalém. Apraz-me informar a Vossa Senhoria que o Governo brasileiro tem defendido a tese de que Jerusalém deve ser colocada sob regime internacional permanente que propicie garantias especiais aos Lugares Santos, e nesse sentido expressei-me no discurso que pronunciei perante a Assembleia Geral de emergência das Nações Unidas. 
Por outro lado, a Delegação brasileira patrocinou, juntamente com outros países latino-americanos, um projeto de resolução que, entre outros pontos, propõe a internacionalização da Cidade Santa, apoiando a posição da Santa Sé. Atenciosos cumprimentos.  
José de Magalhães Pinto". 

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A QUEM PERTENCE JERUSALÉM?


Paulo Roberto Campos

Não é de hoje os conflitos envolvendo árabes e judeus pela disputa de Jerusalém. Nos presentes dias eles acirraram-se e ocupam grande parte do noticiário nacional e internacional devido ao recente reconhecimento, por parte do Presidente dos Estados Unidos, daquela Cidade Santa como capital de Israel. Já na década de 1940 Plinio Corrêa de Oliveira tratou dessa problemática.

A questão Palestina/Israel e as guerras intérminas lá desencadeadas parecem sem perspectiva de solução e a disputa entre árabes e judeus pela posse da Terra Santa vem se agravando dia-a-dia. 


Igreja do Santo Sepulcro em Jerusalém
Desde o término da Segunda Guerra Mundial, tal disputa afligia o mundo. Já naquela época, em numerosos artigos o Prof. Plinio chamava a atenção para a gravidade do problema. Ele insistia especialmente num ponto: Os Lugares Santos foram percorridos e santificados por Nosso Senhor Jesus Cristo, que ali nasceu, viveu e morreu. E os católicos não podem ficar insensíveis, não se importando com o que acontece naquele território, uma vez que à Cristandade pertence Jerusalém e os Lugares Santos. Caso não se importassem, sua atitude seria semelhante à dos Apóstolos no Horto das Oliveiras que se entregaram ao sono e não acompanharam o Redentor em Sua Sacrossanta agonia.

A título de exemplo, segue trecho de um artigo de Plinio Corrêa de Oliveira, publicado em 7-12-47 no semanário "Legionário". Mas antes convém relembrar que, por "Cristandade", o Autor entendia a "Civilização Católica Apostólica Romana, totalmente tal, absolutamente tal, minuciosamente tal".


Representação da cidade
de Jerusalém no séc. XIII
“Vamos agora à questão da Terra Santa. O mundo inteiro está cheio do rumor levantado por ela. Os povos islâmicos se estão movimentando. Os elementos radicais do judaísmo, descontentes, reivindicam a própria posse dos Lugares Sagrados. O problema de saber a quem deve pertencer a Palestina parece insolúvel. Aos árabes? Aos judeus? Ninguém sabe. E como são poucos, neste mundo revolto, os que têm a coragem de enunciar a verdadeira decisão! 
Quem tem a coragem de afirmar o princípio verdadeiro de que Jerusalém e os Lugares Santos, por terem sido consagrados pela Vida, Paixão e Morte de Nosso Senhor Jesus Cristo, são patrimônio da Cristandade, e portanto não podem estar sob domínio exclusivo nem de árabes nem dos judeus?”

3 de dezembro de 2017

Estampa do “Senhor dos Milagres” permanece intacta após 10 dias sob a água


Plinio Solimeo 

No dia 27 de março deste ano, em consequência das chuvas torrenciais que caíram sobre o Peru, o Rio Piura transbordou e inundou parte da cidade do mesmo nome. Entre os edifícios afetados, estava a agência local do Banco de Crédito do Peru (BCP). A água atingiu 50 cm de altura no andar térreo, inundando o seu porão. Nele se encontrava emoldurada uma estampa em cartão do Senhor dos Milagres, piedosa invocação muito venerada no país andino, que ficou durante dez dias sob a água e o lodo, e foi depois encontrada intacta. 

O sucedido em Piura 


Carlos Miano Plaza, gerente regional do BCP em Piura, afirma que o porão do banco se encontra a mais de quatro metros sob o andar térreo, pelo que ficou totalmente inundado de água e de lodo do rio. [Na foto ao lado, à esquerda o BCP inundado]

Atesta ele que, durante cinco dias, procuraram evacuar a água das áreas inundadas. Depois tiveram de remover os escombros e os móveis que haviam se deslocado com a água, juntamente com uma grande quantidade de documentação, artigos de escritório etc., “que, pelo tempo decorrido, estavam em sua grande maioria destruídos ou seriamente danificados”.

“Sucedeu então que, duas semanas depois, na terça feira, 11 de abril, véspera da Semana Santa deste ano, os trabalhadores do banco desceram ao porão e encontraram o quadro do Senhor dos Milagres ‘molhado e com barro’”. Diz ele que, “depois de limpar a imagem, que é de papelão, esta se encontrava intacta, apesar de ter estado tantos dias debaixo da água e do lodo, e não estar protegida nem sequer por um vidro, embora em sua moldura de madeira se possa evidenciar o desgaste produzido pelo sucedido”. [foto ao lado]

Diante desse fato tão singular, a gerente do banco pediu ao setor de Imagem e Cultura do BCP que “nos conceda uma verba para confeccionar uma urna de vidro, para preservar a imagem com sua moldura original, tal qual ficou depois do desastre”. 

Acrescenta que a estampa “fora comprada em 2014, com a finalidade de iniciar uma peregrinação pelas diferentes agências do Banco de Crédito de Piura, peregrinação essa que se tem mantido constante desde essa data e que, ano a ano, culmina com uma grande homenagem ao Senhor dos Milagres, que passa em procissão em frente de nossa sucursal de Piura”.

Isso mostra a fé do povo peruano. Já imaginaram um banco aqui no Brasil organizar uma peregrinação de alguma imagem religiosa por todas suas agências, a qual culminasse com uma procissão? 

Como era natural, também se pronunciou sobre tão portentoso sucesso o arcebispo da cidade, que expressou seu empenho para que “todos os que estiveram envolvidos neste fato prodigioso documentem o seu testemunho para a posteridade, porque no final passarão as gerações, passaremos todos, o banco seguirá, mas ficará esta crônica”

Origem da invocação do Senhor dos Milagres 


O “Senhor dos Milagres” é uma devoção de tal modo popular no Peru, que sua procissão em 28 de outubro pelas ruas de Lima uma das maiores do mundo. [foto acima

Segundo a tradição, trata-se de uma representação de Jesus Crucificado pintada numa parede de adobe por um escravo vindo da Angola e que se encontra atualmente no santuário das “Nazarenas” em Lima. [foto ao lado

Essa pintura se tornou muito venerada depois de um terremoto ocorrido no dia 20 de outubro de 1687, o qual, segundo cronistas da época, durou quinze minutos e arrasou Lima e a vizinha cidade de Callao. O tremor se repetiu duas horas depois, danificando a ermida onde a pintura se encontrava. Entretanto, para surpresa geral, a parede onde ela estava, que havia ruído, se recompôs milagrosamente. 

Testemunhando o milagre, um devoto do piedoso quadro, Sebastião de Antuñano, mandou fazer uma réplica do mesmo, a qual saiu então pela primeira vez em procissão pelas ruas da cidade [foto ao lado]. O fato se repetiu outras vezes, quase sempre depois de algum tremor de terra.

Em reconhecimento pela constante proteção do Senhor dos Milagres durante esses terremotos na capital e na região, o Cabido de Lima, por sugestão de Antuñano e de outros devotos, declarou o venerando Cristo “Patrono jurado pela Cidade dos Reis [antigo nome de Lima] contra os tremores que assolam a Terra”, oficializando assim esse culto também entre os habitantes de Lima.

Mais tarde, junto à capela onde se venerava o Senhor dos Milagres, foi fundado o convento das “Nazarenas”, as quais se vestiam de roxo por devoção a Cristo Nazareno. A instituição da festa recebeu em 1727 a devida aprovação do Papa Bento XIII do Rei da Espanha, Felipe V, estendendo-se também para a transformação do convento em mosteiro de clausura agregado à Ordem das Carmelitas Descalças. 

Lima sofreu em 1746 o mais destruidor terremodo de sua história. No entanto, a parede em que estava o Senhor dos Milagres permaneceu em pé. Quando uma réplica de sua veneranda imagem saiu em procissão pelas ruas da cidade, a terra parou de tremer. Isso fez crescer sua devoção e levou à construção de uma igreja no local da capela original.

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Fontes consultadas: 
https://www.aciprensa.com/noticias/imagen-de-carton-del-senor-de-los-milagros-resistio-intacta-10-dias-bajo-el-agua-59025?utm_source=boletin&utm_medium=email&utm_campaign=noticias_del_dia 
https://es.wikipedia.org/wiki/Se%C3%B1or_de_los_Milagros_(Lima)

28 de novembro de 2017

LIÇÕES IMPRESTÁVEIS

Péricles Capanema 

Amigos ficaram impressionados com temas do meu último artigo “Exemplos inúteis”, análise de aspectos do discurso de Xi Jinping ao 19º Congresso do PCC (Partido Comunista Chinês) realizado em Pequim entre 18 e 24 de outubro. Vou continuar hoje no mesmo caminho, a trilha das lições imprestáveis.

O líder chinês indica como políticas do PCC para a China a aplicação desinibida de teses odiadas pela esquerda no Ocidente (sempre defendidas por economistas partidários da economia de mercado): “Continuaremos a encorajar as pessoas a ganhar dinheiro por meio do trabalho duro. [...] Aumentaremos o tamanho da classe média”. 


Em 2013, sob aplausos delirantes de claque petista, Marilena Chauí [foto], uma das ideólogas do PT, deblaterou contra o papel exercido pela classe média para o harmônico progresso social: “Eu odeio a classe média. A classe média é o atraso de vida, a classe média é a estupidez. É o que tem de reacionário, conservador, ignorante, petulante, arrogante, terrorista. A classe média é uma abominação política, porque ela é fascista. Ela é uma abominação ética porque ela é violenta, e ela é uma abominação cognitiva porque ela é ignorante.”

Continua o dirigente comunista chinês: “Trabalharemos para que a renda individual cresça em harmonia com o desenvolvimento econômico e para que os aumentos de salário sejam proporcionais aos aumentos da produtividade no trabalho”. 

Algum partido esquerdista patrocina tal tese? Algum sindicato? Contudo, qualquer economista pró-mercado assinaria o que anuncia Xi Jinping: aumento de salários sem aumento de produtividade gera inflação. 

Para resolver o problema habitacional na China, o dirigente recorre à política da casa própria e ao estímulo dos aluguéis. Isso mesmo, comprar para alugar. No combate à pobreza, os partidários do mercado livre associam os programas assistenciais ao estímulo da autonomia pessoal mediante a capacitação, o que deixaria o Estado no papel subsidiário, para desespero das correntes coletivistas. Atentem para o que diz Xi Jinping, é o que ele faz: “Colocaremos ênfase especial em ajudar a pessoas a aumentar a confiança em suas próprias capacidades para sair da pobreza e propiciaremos a educação de que tenham necessidade para tal”. É o elogio ao papel supletivo do Estado. 

“Apoiaremos o desenvolvimento na área privada, de hospitais e de setores ligados à saúde”. Claro estímulo à medicina privada. 

Na área da segurança: “Aceleraremos o desenvolvimento dos sistemas de controle e prevenção ao crime [...] contra quaisquer atividades ilegais e criminosas como pornografia, jogo, consumo de drogas, violência de gangues, sequestro, fraude. Protegeremos os direitos pessoais, o direito de propriedade privada e o direito à dignidade”. Aqui no Brasil seria ponto destacado de plataforma de candidato da direita, alvo certo dos ataques da imprensa engajada.

O Partido Comunista Chinês precisa criar um país rico. Aplica receitas do estilo Ronald Reagan ou Margaret Thatcher. Por que digo que são lições imprestáveis? Nenhum partido de esquerda, por causa do exemplo chinês, modificará um til seu programa gerador de pobreza e sofrimento popular. 

Até aqui a cara da moeda. Agora, a coroa. Outro ponto são os objetivos últimos de tal política. Em artigo recente, “Pasmaceira e Festança Suicidas”, falei de parte deles. Não vou aqui voltar a eles. 


PS: Observação final. Xi Jinping tem uma filha, Xi Mingze [foto], nascida em 1992. Estudou francês na Hangzhou Foreign Language School. A partir de 2010, vigiada por seguranças chineses, foi aluna de Harvard. Formou-se em 2014, vive em Pequim. Dispensa comentários.

26 de novembro de 2017

Notas de perplexidade acerca da Mensagem do Papa Francisco sobre o final da vida

Federico Catani

A mensagem enviada pelo Papa Francisco aos participantes do Encontro Regional Europeu da Associação Médica Mundial [ao lado a mensagem no site do Vaticano] sobre questões relacionadas com o final da vida, realizado no Vaticano de 16 a 17 de novembro, teve grande eco midiático. Em particular, a mídia secular destacou uma guinada considerável da Igreja sobre a eutanásia: de uma clara censura se teria passado a uma abertura prudente, mas clara. A resposta no campo católico foi geralmente a de que o Papa reiterou a doutrina de sempre, e que, a admitir-se uma mudança, ela diz respeito apenas à maneira de abordar a questão e ao idioma usado, percebido como mais dialogante. 

Se é verdade que a mídia laicista obviamente se serviu da Mensagem papal para seus próprios interesses e, portanto, para promover, em particular na Itália, uma lei sobre o chamado “testamento biológico” (ou seja, a legalização da eutanásia), é igualmente inegável que as palavras de Francisco contêm alguns pontos em relação aos quais se fica pelo menos perplexo.


1. Em primeiro lugar, o Papa põe o foco de sua atenção na chamada “obstinação terapêutica” — que é o tema central da Mensagem —, como se este fosse o principal problema hoje no mundo hospitalar. Mas fatos que foram objeto de crônicas muito recentes, como o do pequeno Charlie Gard, mostram que esse não é o caso. A doutrina moral da Igreja certamente sempre condenou a obstinação terapêutica e, nesse sentido, o Papa Francisco de fato não diz nada de novo. Deve-se, contudo, notar que os grupos que favorecem a legalização da eutanásia fazem deliberadamente confusão em torno dos conceitos de “obstinação terapêutica” e de “eutanásia”, apoiando-se na emoção da opinião pública e apresentando à atenção da mídia casos humanos extremos e devastadores. Apresenta-se amiúde como desproporcional uma terapia ou um tratamento que não o é realmente. Confundir e deturpar as palavras faz parte da estratégia da Revolução, neste caso denominada “cultura da morte”.

2. Mas o ponto mais preocupante do discurso é aquele no qual o Papa Francisco acena para um acordo entre as várias correntes em luta, e até mesmo para a aprovação de uma eventual legislação em matéria de fim de vida: "No seio das sociedades democráticas, tópicos delicados como esses devem ser confrontados com calma: de modo sério e reflexivo, e bem dispostos a encontrar soluções — mesmo normativas — tanto quanto possível compartilhadas. Por um lado, de fato, deve-se ter em conta a diversidade de visões do mundo, as convicções éticas as afiliações religiosas, em um clima de recíproca escuta e aceitação.”


Na prática, a doutrina sobre os princípios não negociáveis é pela enésima vez esquecida. A impossibilidade de se chegar a um compromisso nesses temas fundamentais — cujo enunciado por Bento XVI lhe atraiu as críticas e os dardos do mundo — já não é considerada como tal por Francisco. O Papa de fato reconhece que pode haver uma lei para reger o chamado fim de vida. E até mesmo declara que isso deve acontecer tirando uma linha média entre as diferentes posições e visões, com o que se chegaria inevitavelmente a um resultado contrário à doutrina moral católica. A contradição com o n° 73 da Evangelium vitae também é evidente. No caso da Itália, ainda não existe uma lei sobre o chamado “testamento biológico” e o mundo católico deve impedir que isso aconteça. Se de fato se ceder nesse ponto, acontecerá com a eutanásia o mesmo que aconteceu com o aborto, com o divórcio e com o “casamento” homossexual: abrir-se-á uma brecha no dique e será dificílimo fechá-la, pela técnica hoje bem conhecida do slippery slope, ou ladeira escorregadia. Aprovar hoje uma lei sobre o assunto só serve para isso. 

3. Além disso, o Papa Francisco afirma que “para determinar se uma intervenção médica clinicamente apropriada é realmente proporcionada não é suficiente aplicar mecanicamente uma regra geral. É preciso um discernimento cuidadoso, que considere o objeto moral, as circunstâncias e as intenções das pessoas envolvidas”. A mesma linguagem usada para os divorciadas recasados em Amoris laetitia... No entanto, os médicos normalmente já fazem isso: cada paciente e cada doença é um caso à parte, sem prejuízo, entretanto, da verdade moral, que não muda. Aqui, pelo contrário, o Papa escolhe uma linguagem que favorece o relativismo, já amplamente em uso nesses casos.

Bem diversa foi a resposta que a Congregação para a Doutrina da Fé deu, em 2007, aos dubia da Conferência Episcopal dos Estados Unidos ao afirmar claramente que, por exemplo, a hidratação e a alimentação artificiais, exceto obviamente nos casos em que o corpo não pode absorver mais nada, nunca devem ser consideradas como obstinação terapêutica.

Isso não transparece nas palavras de Francisco, as quais, na verdade, inclusive podem confundir: “As intervenções no corpo humano estão se tornando cada vez mais eficazes, mas nem sempre são decisivas: podem sustentar funções biológicas que se tornaram insuficientes, ou mesmo substituí-las, mas isso não equivale a promover a saúde”. Conforme observou Tommaso Scandoglio em La Nuova Bussola quotidiana, para evitar interpretações enganosas bastaria adicionar o advérbio “sempre” diante da expressão “a promover a saúde”

Como conclusão, além de qualquer interpretação destinada a minimizar ou acentuar a pretensa novidade da Mensagem papal, sem todas as observações técnicas possíveis e independentemente das intenções reais ou não, um resultado é evidente: as palavras do Papa Francisco, pelo menos na Itália, ofereceram ajuda e publicidade àqueles que vêm lutando para introduzir a eutanásia no sistema legal. 
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Fonte: https://www.atfp.it/
Tradução: Hélio Dias Viana

25 de novembro de 2017

CÍRIO DE NAZARÉ

A maior festa religiosa católica do Brasil e uma das maiores do mundo

Carlos Sodré Lanna 

No segundo domingo de outubro realiza-se anualmente em Belém do Pará uma grande procissão do Círio de Nazaré. Na realidade, as celebrações começam uma semana antes e terminam uma semana depois. 

Círio tem sua origem na palavra latina cereus, que significa vela grande, tendo sua festa no Pará sido declarada Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO em dezembro de 2013. 

Segundo uma antiga tradição, a imagem original de Nossa Senhora de Nazaré, venerada na cidade portuguesa do mesmo nome, teria saído no ano 361 de Nazaré da Galileia, onde a esculpira o próprio São José, na casa onde morava a Sagrada Família. Entalhada em madeira escura, a Virgem Maria aparece sentada, com o Menino Jesus ao colo. 

Identificada como original desde os primeiros séculos do cristianismo, a histórica imagem percorreu a Cristandade a partir de Israel, indo parar nas mãos de São Jerônimo que, temeroso por sua segurança devido aos ataques dos inimigos da fé católica, enviou-a a Santo Agostinho no Norte da África. Mais tarde ela foi ter nas mãos dos monges agostinianos, que a levaram para Mérida, na Espanha. Por ocasião das invasões muçulmanas em terras hispânicas, ela foi escondida em um local de difícil acesso, ficando ali esquecida durante muito tempo. 

Posteriormente, devido a uma batalha, no ano 711 a imagem foi retirada de seu esconderijo e levada para Nazaré, em Portugal, onde também permaneceu escondida por um longo período no Pico de São Bartolomeu.

Em 1182, o nobre português Dom Fuas Roupinho participava de uma caçada naquele pico. Ao perseguir um cervo, seu cavalo esteve a ponto de cair em um precipício, quando ele invocou Nossa Senhora e foi salvo [quadro ao lado]. Em ação de graças, mandou edificar no local a Capela da Memória, onde os operários encarregados da construção descobriram a imagem. A notícia se espalhou, atraindo muitas pessoas, que passaram a acorrer ao local para venerá-la, operando-se muitos milagres. 

Este episódio está imortalizado em um dos vitrais da Basílica do Belém do Pará, onde um cavaleiro aparece perseguindo um cervo que cai em um precipício. 


Em 1377, Dom Fernando (1367-1383), Rei de Portugal, construiu um templo maior na cidade de Nazaré, o Santuário de Nossa Senhora de Nazaré [foto acima], para onde a imagem foi transferida. Desde então, na data no dia 8 de setembro de cada ano, os portugueses se reúnem no local para celebrar o Círio de Nazaré. 

A devoção à imagem cresceu com os milagres e graças alcançadas por seu intermédio. Diante dela rezou São Francisco Xavier antes de partir para o Oriente, e foram os padres jesuítas, seus irmãos de hábito, que trouxeram sua devoção para o Brasil em 1653. 

Nossa Senhora de Nazaré no Brasil 

A imagem de Nossa Senhora de Nazaré venerada em Belém do Pará [foto ao lado] é semelhante àquela celebrada no Círio português. Segundo antiga tradição, transcorria o ano 1700 quando o jovem Plácido José de Souza, andando pelas margens do igarapé de Utinga, onde se ergue hoje a Basílica Santuário em Belém do Pará , encontrou entre pedras e entulhos a pequena imagem de Nossa Senhora de Nazaré. 

Esculpida em madeira e com 28 cm de altura, Plácido a levou para casa, limpou-a e colocou-a em um altar improvisado. Conforme as narrativas da época, a imagem retornou várias vezes, sem explicação, ao local onde fora encontrada. Percebendo Plácido que se tratava de um desígnio sobrenatural de Nossa Senhora, promoveu então a construção ali de uma capela para abrigá-la. 

A divulgação deste milagre chamou a atenção não só dos habitantes da região, que frequentavam a capela para rezar, mas também do governador da capitania, Francisco Coutinho, que ordenou a remoção da imagem para a capela do palácio da cidade. Como sucedera com Plácido, a imagem também desapareceu mais de uma vez do palácio do governador para voltar ao nicho de sua capela. Desta maneira a devoção adquiriu um caráter oficial, tendo sido construída no mesmo local uma igreja, que se tornou hoje a Basílica de Nossa Senhora de Nazaré de Belém. 

Em 1773, o Bispo do Pará colocou a cidade de Belém sob a proteção de Nossa Senhora de Nazaré. Mandada a Portugal no início de 1774 para ser submetida a uma restauração, por ocasião de sua volta, ocorrida no mês de outubro do mesmo ano, a imagem foi levada em romaria pelos fiéis do porto até o santuário, com a participação do governador, do bispo e de autoridades civis e eclesiásticas, sob a escolta de tropas militares. Este foi considerado o primeiro Círio de Nazaré. 

As festividades do Círio em Belém 

As comemorações anuais do Círio em Belém compõem-se de várias etapas, que se estendem por quinze dias, perfazendo um total de 12 procissões oficiais. O principal evento ocorre no segundo domingo de outubro com a grande procissão do Círio, que tem reunido mais de dois milhões de pessoas na capital do Pará, hoje com um milhão e meio de habitantes. 

Conforme a tradição, ela sai bem cedo da Catedral de Belém e percorre cerca de cinco quilômetros até a Basílica Santuário de Nossa Senhora de Nazaré, percurso que pode durar até nove horas, como já ocorreu devido ao enorme número de participantes, ficando ali exposta para veneração pública durante quinze dias, na chamada Quadra Nazarena

Nesta procissão aparece um número enorme de pagadores de promessas oriundos de lugares distantes do Brasil, sobretudo do Norte e do Nordeste, que em sinal de agradecimento pelas graças e curas recebidas levam casas em miniatura, partes do corpo humano feitas com cera, sinais de milagres e miniaturas de barcos, sendo os círios e as velas os mais comuns. 

Durante todo o percurso a imagem de Nossa Senhora de Nazaré é objeto de grandes homenagens de todos os presentes, como chuvas de papéis picados, foguetes e fogos de artifícios, flores variadas, palmas vibrantes, diversos cânticos, executados até por corais e orquestras. 

Existe também o costume de preparar comidas típicas da Amazônia e região para os participantes das celebrações, as quais são postas em barracas próximas das maiores concentrações de público. 

As diversas romarias do Círio de Nazaré 

São 12 as procissões oficiais das celebrações do Círio de Nazaré: 
1) Translado em carro aberto da Basílica de Nazaré para Ananindeua-Marituba;
2) Romaria rodoviária em direção à Vila de Icoaraci, distrito de Belém; 
3) Romaria fluvial [foto ao lado] durante a qual a imagem é levada de barco pela baía de Guajará em direção a Belém; 
4) Moto-romaria do cais de Belém, na qual a imagem, em carro aberto, é seguida por motoqueiros até um colégio no centro de Belém, onde é celebrada uma missa; 
5) Transladação à noite, antes do Círio, à luz de velas, na Berlinda, carro da imagem de Nossa Senhora; 
6) Procissão do Círio, auge dos festejos, que tem reunido mais de dois milhões de participantes nos últimos 12 anos; 
7) Ciclo-romaria, a mais nova das procissões, que acontece desde 2004, a pedido da Federação dos Ciclistas do Pará; 
8) Romaria da juventude, comunidades de jovens das paróquias que veneram a Rainha da Amazônia; 
9) Romaria das crianças, para fortalecer a devoção mariana e nas quais elas vão acompanhadas dos pais; 
10) Romaria dos corredores, procissão em forma de corrida lenta, para acompanhar a imagem de perto; 
11) Procissão da festa, organizada pela diretoria das festividades de Nazaré e comunidades da Basílica Santuário; 
12) Recírio, procissão de despedida realizada duas semanas após o Círio.

Os símbolos do Círio de Nazaré 

As celebrações do Círio apresentam vários objetos simbólicos, os quais podem ser vistos durante todas as procissões. 

A Berlinda [foto ao lado], que transporta a imagem de Nossa Senhora, é por causa disto o centro de todas as atenções no decurso dos 15 dias de festejos.

A conhecida corda de sisal torcido [foto abaixo], com duas polegadas de diâmetro e 400 metros de comprimento, ligada à berlinda e puxada pelos fiéis durante a procissão, passou a ser o elo entre Nossa Senhora de Nazaré e os fiéis.

O manto da imagem de Nazaré é considerado um dos mais importantes símbolos do Círio. Anualmente é apresentado dele um novo modelo, confeccionado com material importado da melhor qualidade, fruto de doações anônimas.

Outro símbolo são os carros dos milagres e de promessas, que vão recolhendo dos devotos relatos e demonstrativos dos milagres e graças alcançados pelos fiéis da Virgem de Nazaré. 

Chamam muito a atenção, de um lado as inúmeras crianças vestidas de anjos nas procissões, e de outro os foguetes e fogos de artifícios que são usados durante o percurso pelas ruas e avenidas da cidade de Belém.

Outra tradição são os cartazes espalhados pela cidade anunciando as festas e os almoços, as reuniões de famílias e os pratos típicos da culinária da região, além das barraquinhas existentes na praça em frente à Basílica de Nossa Senhora de Nazaré. 

Em 2005 participaram do Círio dois milhões de pessoas, número que desde então só tem aumentado, chegando em 2017, quando de sua 225ª procissão, a um total de 2,5 milhões de participantes.